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BOMBEIRO CIVIL: REQUISITOS PARA O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO

Artigo de autoria da Procuradora do Trabalho Cirlene Luiza Zimmermann1

O exercício da profissão de bombeiro civil foi regulamentado em âmbito nacional pela Lei nº 11.901/2009, que definiu o bombeiro civil como aquele que, habilitado nos termos desta Lei, exerce, em caráter habitual, função remunerada e exclusiva de prevenção e combate a incêndio, como empregado contratado diretamente por empresas privadas ou públicas, sociedades de economia mista, ou empresas especializadas em prestação de serviços de prevenção e combate a incêndio.

Contudo, é importante que se esclareça que a atuação dos bombeiros civis não é restrita à prevenção e ao combate a incêndios, competindo-lhes também as tarefas de avaliação e identificação de riscos em geral; a liberação e o acompanhamento das atividades com possibilidade de perda material ou humana; o atendimento de emergências, especialmente com a prestação dos primeiros socorros, como em acidentes de trânsito, atropelamentos, afogamentos e a realização de salvamentos terrestres, aquáticos e em altura.

O bombeiro civil, portanto, é trabalhador de grande importância, pois sua atuação preventiva e mesmo combativa visa preservar o meio ambiente como um todo, inclusive o do trabalho, tendo em vista a garantia conferida pelo constituinte a todos os trabalhadores de terem reduzidos os riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Ainda que seja possível aos empregadores ter outros profissionais na empresa treinados para as atividades de prevenção e combate a incêndio, a contratação de bombeiros civis, que atuem de forma exclusiva na prevenção de sinistros, tornará o ambiente de trabalho muito mais seguro.

Em razão da relevância da profissão, a Lei federal estabeleceu a jornada especial de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, num total de 36 horas semanais de trabalho para o bombeiro civil. Impôs, ainda, ao empregador público ou privado, o dever de fornecer reciclagem periódica e uniforme especial, contratar seguro de vida em grupo e pagar o adicional de periculosidade de 30% do salário mensal sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.

As funções de bombeiro civil são classificadas pela Lei federal em três níveis: bombeiro civil, nível básico, combatente direto ou não do fogo; bombeiro civil líder, o formado como técnico em prevenção e combate a incêndio, em nível de ensino médio, comandante de guarnição em seu horário de trabalho; e o bombeiro civil mestre, o formado em engenharia com especialização em prevenção e combate a incêndio, responsável pelo departamento de prevenção e combate a incêndio. 

A Lei federal exigiu habilitação para o exercício da função, sem, contudo, elencar os requisitos dessa qualificação em nível básico ou técnico (o art. 7º, que atribuía ao Poder Executivo a fixação do currículo dos cursos de formação de bombeiro civil e dos cursos técnicos de ensino médio de prevenção e combate a incêndio, foi vetado), permanecendo aplicável, portanto, a NBR 14608, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), visto que a ABNT foi designada como o Foro Nacional de Normalização por meio da Resolução nº 07 do Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – Conmetro, de 24.08.1992.

A NBR 14608, vigente desde o ano 2000, foi desenvolvida no âmbito do Comitê Brasileiro de Segurança contra Incêndio e da Comissão de Estudo de Brigada de Incêndio da ABNT, tendo surgido da necessidade de se padronizar a qualificação, a aplicação e as atividades do bombeiro profissional civil, contendo apenas padrões mínimos, ficando as organizações livres para agregar outros, de acordo com as suas necessidades e/ou riscos envolvidos.

Seria admissível, portanto, que determinada empresa incluísse nas exigências do curso de formação ou de reciclagem de seus bombeiros civis questões específicas relacionadas às suas peculiares condições de trabalho. Não somente admissível, como aconselhável, a fim de conferir efetividade à função preventiva exercida pelos profissionais.

A norma técnica da ABNT dispõe que o curso de formação do bombeiro profissional civil deve ser ministrado por profissionais habilitados de empresa especializada ou órgão público competente, com carga horária mínima de 56 horas, sendo 40 horas de teoria e 16 horas de prática, com reciclagem anual de 28 horas. A qualificação teórica mínima do bombeiro profissional civil é formada por 42 módulos, envolvendo noções de legislação, química e física, propagação do fogo, explosões, agentes extintores, equipamentos de combate a incêndio, equipamentos de proteção individual, sistemas de detecção e alarme de incêndio, iluminação e saídas de emergência, produtos perigosos, análise de riscos, controle de pânico, relatório e estatística, análise de vítimas, vias aéreas, reanimação cardiopulmonar, estado de choque, hemorragias, fraturas, ferimentos, queimaduras, emergências clínicas, como convulsões, AVC, diabetes, e transporte de vítimas.

Além desse currículo básico, a NBR impõe o respeito às exigências curriculares das legislações estaduais pertinentes. No caso de Rondônia, a Lei nº 3.271/2013 prevê que compete ao Corpo de Bombeiros Militar do Estado – CBMRO, a definição da grade curricular e da carga horária mínima para a formação, qualificação, revisão de conhecimentos, atividades de registro dos bombeiros civis e congêneres em colaboração com o Estado. Dispõe, ainda, que as empresas que atuam na formação e na prestação de serviços relacionadas às atividades desempenhadas por bombeiros civis deverão credenciar-se junto ao CBMRO, a quem compete estabelecer os requisitos necessários ao credenciamento dessas instituições, exercendo a respectiva fiscalização.

A Lei federal nº 11.901/2009 prevê que no atendimento a sinistros em que atuem, em conjunto, os bombeiros civis e o Corpo de Bombeiros Militar, a coordenação e a direção das ações caberão, com exclusividade e em qualquer hipótese, à corporação militar. Portanto, é coerente que a formação dos bombeiros civis seja supervisionada pelos militares, como bem estabeleceu a Lei estadual nº 3.271/2013.

Nesse aspecto, é importante lembrar que a Constituição Federal garante a todos o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Não há dúvida que a Lei federal impôs que o bombeiro civil fosse qualificado para o exercício da profissão, sendo que tal habilitação deve ocorrer por empresas que atendam às normas expedidas pelos órgãos oficiais competentes (o CBMRO, segundo a Lei estadual) ou, se normas específicas não existirem, pela ABNT ou outra entidade credenciada pelo Conmetro, nos termos do Código de Defesa do Consumidor.

Isso não impede, contudo, que as escolas de formação, sob o manto da livre concorrência e observados os padrões mínimos estabelecidos pelos órgãos oficiais, agreguem outros conhecimentos teóricos ou abordagens práticas em seus currículos, a fim de tornar a qualificação dos bombeiros civis por elas preparados mais completa e/ou especializada e, assim, terem a preferência dos interessados na realização do curso e/ou das empresas que buscam profissionais da área.

Atualmente, não existe nenhum serviço federal de fiscalização da profissão de bombeiro civil, o qual somente poderia ser criado por lei federal, nos termos do art. 58 da Lei nº 9.649/1998, situação em que atuaria por delegação do Poder público, inclusive na aplicação de penalidades (poder de polícia), mas também se submetendo ao controle das contas pelo Tribunal de Contas da União e às exigências de realização de concurso público para contratação dos empregados e de licitação para aquisição de produtos e serviços.

Por consequência, também não há, atualmente, exigência de prévio registro em nenhum órgão para o exercício regular da profissão de bombeiro civil, de modo que afronta a Constituição qualquer imposição nesse sentido para contratação de bombeiros civis, em qualquer nível, seja em processo seletivo público ou privado. Importante destacar que o art. 3º da Lei federal nº 11.901/2009 estabelecia a necessidade do prévio registro no órgão competente do Poder Executivo. Todavia, referido dispositivo também foi vetado, pois impunha à Administração Pública o ônus de criar e manter um registro profissional cuja necessidade e funcionalidade não foram demonstradas.

Portanto, entendeu o Poder Executivo federal que o prévio registro do bombeiro civil em qualquer órgão era exigência desnecessária, de modo que não se trata de requisito para o exercício da profissão.

Em decorrência disso, a previsão em leis municipais de registro regular do bombeiro civil em qualquer órgão de classe ou associação/sindicato profissional, como a contida na Lei nº 2.245/2015 do Município de Porto Velho, viola os direitos constitucionais ao livre exercício da profissão e da liberdade de associação, já que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado para usufruir de qualquer direito, situação que se verificaria se exigido por empresa pública ou privada o prévio registro em associação particular para o regular exercício da profissão de bombeiro civil.

Ressalte-se que o aprimoramento das medidas de segurança em prevenção e resposta a emergências em áreas e edificações, abertas ou fechadas, públicas e privadas, é prática que deve ser incentivada em todos os níveis de governo, inclusive com o melhor aparelhamento do Corpo de Bombeiros Militar e a qualificação de seus profissionais, pois preserva o meio ambiente, a vida, a integridade física e a saúde da população em geral. Tal propósito, contudo, não pode servir para transferir atribuições típicas de órgãos públicos, como a fixação de normas mínimas e a fiscalização de seu cumprimento, para entidades privadas, nem impedir os bombeiros civis de exercerem livremente a sua nobre profissão.

1 Procuradora do Trabalho do Ministério Público do Trabalho e Coordenadora Regional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho da Procuradoria Regional do Trabalho da 14ª Região.

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